Ilustres Colegas
Neste primeiro Boletim de 2023, queremos antes de mais agradecer a confiança que nos conferiram e desejar um excelente mandato a todos os órgãos da Ordem dos Advogados que foram eleitos.
A Ordem dos Advogados é uma estrutura que obriga a uma dedicação diária, a qual assumimos com elevada responsabilidade e espírito de missão.
Durante o primeiro mês de mandato cumprimos a formalidade de dar posse a todos os órgãos nacionais e regionais da Ordem dos Advogados, para que todos pudessem começar a trabalhar o mais rápido possível, no cumprimento das suas atribuições e em prol da Advocacia.
Começámos também desde logo a organizar os eventos maiores da Advocacia no presente ano – o Dia do Advogado e o IX Congresso dos Advogados Portugueses que, como sabemos, é o órgão máximo da instituição.
No que respeita ao Dia do Advogado, pretendemos que se abrisse a oportunidade a comarcas mais pequenas de poderem, também elas, organizarem um dos mais importantes eventos da nossa casa, levando esta celebração a locais inéditos. Nesse sentido, a escolha deste ano recaiu sobre a cidade de Beja, que sem dúvida nenhuma esteve à altura da importância deste evento.
Quanto ao trabalho que vem sendo desempenhado por este Conselho Geral, importa salientar que pela primeira vez desde há muito tempo, foi possível organizar uma equipa que vem garantindo uma resposta atempada aos pareceres que são solicitados à Ordem dos Advogados, quer legislativos quer internos, numa atuação de enorme valia do pelouro do Conselho Geral que tem permitido, nomeadamente no que tange a feitura das leis, uma intervenção concreta da instituição, que tem sido amplamente notada e referenciada nos plenários da Assembleia da República.
Nestes primeiros meses de mandato, foi ainda possível reunir com a Direção da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS), para aferir da possibilidade de implementar alterações ao regulamento daquela instituição com regras de contribuição mais justas e com mais valias previdenciais para os/as beneficiários/as, enquanto não é encontrada uma solução definitiva para a previdência da Classe.
Ainda no que respeita aos direitos sociais da Advocacia, a OA apresentou ao Ministério da Justiça (MJ) uma proposta de alteração ao Decreto-Lei n.º 131/2009, que consagra o direito dos/as advogados/as ao adiamento dos atos processuais, visando alargar o âmbito deste diploma, quer no que respeita aos prazos neles previstos, quer no que respeito ao tipo de actos e prazos suscetíveis de adiamento. Nessa sequência, também a nível interno, a OA passará a devolver quotas referentes a 6 meses (180 dias) às Advogadas, por altura do nascimento das suas crianças.
No âmbito das relações institucionais externas, destacamos a participação da OA em reuniões com a “UALP – União dos Advogados de Língua Portuguesa”, com o “CCBE – Council of Bars and Law Societies of Europe”, com a “Fédération des Barreaux d’Europe”, com a “UIBA – Union Iberoaméricana de Colégios Y Agrupaciones de Abogados” e com a “IBA – International Bar Association”, sendo absolutamente crucial o reforço e estreitamento de laços com estas instituições para a defesa da profissão no país, no espaço da EU, da América Latina e do Mundo.
Quanto ao assunto na ordem do dia, como é do conhecimento de todos, a Advocacia está atualmente a ser alvo de um ataque gravíssimo por parte do Governo e que vai muito para além das alterações que eram impostas pela nova Lei das Associações Públicas Profissionais.
Sem que nada o obrigasse e baseado num mal fundamentado relatório da Autoridade de Concorrência, o Governo decidiu retirar à Advocacia a exclusividade de alguns dos seus atos próprios, nomeadamente a consulta jurídica, a elaboração de contratos e a negociação e cobrança de créditos.
Inicialmente, estas alterações iam inclusive no sentido de entregar estes atos a entidades públicas (como municípios e juntas de freguesia), a organizações não governamentais, a quaisquer pessoas colectivas de direito privado, etc., levando a que os mesmos pudessem ser praticados por pessoas sem qualquer formação jurídica ou até sem qualquer qualificação profissional.
Sem qualquer estudo prévio quanto ao impacto que estas alterações podiam ter na vida dos/as cidadãos/ãs e sem qualquer motivo válido que as pudesse fundamentar, o Governo lançou-se inopinadamente numa precipitação reformista do Estatuto da Ordem dos Advogados e da Lei dos Atos Próprios dos Advogados e Solicitadores, que poderá provocar uma autêntica tragédia nos direitos, liberdades e garantias dos/as cidadãos/ãs.
E fê-lo da forma mais traiçoeira possível, não avisando previamente a Ordem dos Advogados, não negociando a necessidade e os termos dessas alterações e concedendo à Ordem dos Advogados um mero prazo de 48 horas úteis (a terminar num feriado local) para se pronunciar quer quanto à proposta de alteração do seu próprio Estatuto, quer quanto à Lei dos Atos Próprios.
Antevendo que este “procedimento” legislativo poderia passar-se desta forma (porque aliás é típico deste Governo), e como forma de preparar medidas de reação a tal irresponsabilidade, os/as Advogados/as realizaram uma das Assembleias Gerais Extraordinárias mais participadas de sempre, onde aprovaram diversos meios para protestar e pugnar contra aquelas alterações.
E não temos dúvidas de que foi graças ao empenho de todos/as os/as Advogados/as, quer naquela Assembleia, quer na execução das medidas de protesto aprovadas, que, apesar de tudo, foi possível obrigar o Governo a inverter caminho em algumas das alterações que propôs, obrigando-o a retirar do documento a possibilidade de consulta jurídica por entidades públicas, ONG’s e pessoas colectivas de direito privado.
Contudo, a versão final apresentada pelo Governo (que foi tornada pública numa conferência de imprensa, antes de ser dada a conhecer à Ordem dos Advogados) continua a padecer de alterações irresponsáveis, mal pensadas, mal fundamentadas, e que irão prejudicar gravemente os direitos, liberdades e garantias dos/as cidadãos/ãs.
Desde logo, não podemos admitir que membros de um Governo, e particularmente do Ministério da Justiça, não saibam o que é uma verdadeira “consulta jurídica”, com todas as implicações e consequências que a mesma pode ter.
Todos/as os/as Advogados são licenciados em Direito. Nessa qualidade, sabemos perfeitamente que a mera licenciatura em Direito, sem a formação e a prática da Advocacia, não nos habilita a dar uma consulta jurídica digna desse nome, em que seja abordado não apenas o conteúdo da Lei, mas também as suas implicações práticas, a estratégia a seguir para evitar ou preparar um eventual processo judicial, a necessidade de obter ou preservar provas, os custos judiciais que tudo isso pode acarretar, etc.
Isto sem falar de todos os direitos de que o/a cidadão/ã beneficia quando consulta um/a Advogado/a (como o sigilo profissional, a ausência de conflito de interesses, a proibição de violação de correspondência, etc.), e que nunca estarão garantidos se a consulta for realizada por alguém que não é Advogado/a.
O mesmo se passa quanto à elaboração de contratos e à negociação e cobrança de créditos, que serão entregues a empresas, sem qualquer garantia de que os mesmos são praticados por Advogados/as. O Governo rende-se à sua incapacidade de combater aquilo que actualmente são actos de procuradoria ilícita e, pasme-se, torna essas condutas criminosas em condutas legais.
A Ordem dos Advogados tem como missão primeira a defesa do Estado de Direito Democrático e dos direitos, liberdades e garantias dos/as cidadãos/ãs. No cumprimento do seu dever estatutário, a Ordem dos Advogados não se calará perante tamanha iniquidade.
Numa altura crucial em que a nossa profissão está a ser alvo de um ataque sem precedentes, é essencial que a Advocacia se una em defesa do núcleo essencial da nossa profissão.
Estamos conscientes da magnitude da nossa tarefa e nem sempre é fácil comunicar os detalhes de todo o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido, mas saibam que continuam a contar connosco porque nos bateremos com todo o empenho para trazer a OA para uma presença mais próxima da Advocacia.
Contam connosco tal como contamos convosco para fazer esta caminhada!
Sem Advogados/as não há justiça, sem justiça não há Democracia.