“TROIKA” Dez anos depois
No dia 17 de Maio de 2011 assinalaram-se 10 anos da entrada em vigor do Programa de Assistência Económica e Financeira, também designado por Memorando de Entendimento entre o Governo português e a “Troika” (Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu), que deixou marcas nestes últimos 10 anos que ficarão para sempre na memória dos portugueses.
Segundo um estudo publicado em 2016 pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, e reproduzido no estudo da mesma fundação em 2019, um dos efeitos trágicos da crise que assolou Portugal a partir de 2008 verificou-se no âmbito da trajectória das desigualdades. Enquanto entre 1993 e 2009 se registou uma diminuição de 4,7 % da taxa de pobreza (passando de 22,5 % para 17,9 % da população), entre 2009 e 2014, essa taxa aumentou para 19,5%. A intensidade da pobreza atingiu, em 2013, 30,3 %, valor em linha com o de 2004. Já a taxa de pobreza das crianças e dos jovens passou de 22,4% para 24,8% entre 2009 e 2014.
Numa década, Portugal foi reduzindo progressivamente o défice orçamental, que passou dos 7,7% do Produto Interno Bruto (PIB) registados em 2011 para 0,3% em 2018. E, em 2019, conseguiu pela primeira vez apresentar excedente das contas públicas, muito força das sucessivas medidas de autoridade que foram sido aplicadas e com os aumentos de impostos, quer directos quer indirectos. A título de exemplo em 2012, os limites aplicados às deduções de despesas de saúde no IRS baixam de 30% para 10%, o que rende 440 milhões de euros ao Estado.
A Economia e as exportações cresceram e quanto tudo parecia estar no bom caminho veio a pandemia que nos trocou as voltas. Para este ano, o FMI prevê que o défice se situe nos 5% do PIB e que a dívida pública fique nos 131,4%.
Entre as muitas medidas para o mercado laboral constantes do memorando, estavam os cortes no subsídio de desemprego e a flexibilização dos critérios para despedimentos e os cortes nas pensões. As medidas para facilitar os despedimentos acabaram travadas pelo Tribunal Constitucional.
Os objectivos constantes do memorando para a Justiça eram o da reestruturação do Sistema Judicial, essencial para o funcionamento correcto e justo da economia, permitindo assegurar de forma efectiva e atempada o cumprimento de contratos e de regras da concorrência, aumentar a eficiência através da reestruturação do sistema judicial e adoptar novos modelos de gestão dos tribunais por forma a reduzir a lentidão do sistema através da eliminação de pendências e facilitando mecanismos de resolução extra judiciais.
Foram muitas as reformas levadas a cabo neste sector, desde logo através da nova Lei da Organização do Sistema Judiciário, a Lei nº 62/2013, de 26 de Agosto, que alterou o mapa judiciário, uma das medidas mais contestadas pelos operadores judiciários, em particular, pela Ordem dos Advogados. Nesta sequência o Novo Mapa Judiciário do país passou a ter 23 Comarcas coincidentes com os distritos, em vez das 39 inicialmente previstas, a que correspondem 23 grandes Tribunais Judiciais, e dos 311 tribunais existentes, 264 tribunais foram convertidos em 218 Secções de Instância Central e em 290 Secções de Instância Local.
O fecho de 47 tribunais por todo o país, tornou a justiça menos acessível e com mais custos para os cidadãos dessas comarcas.
Esta lei esta viria a ser alterada pela Lei nº 19/2019, de 19 de Fevereiro, visando ajustamentos ao mapa judiciário, através da reabertura de alguns tribunais e do reforço da oferta especializada, e assim uma maior proximidade dos cidadãos à justiça e a adequação dos respectivos quadros de juízes e magistrados do Ministério Público, tendo por referência a evolução processual.
Em 2011 a Ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, referiu que o documento entregue à ‘troika’ revelava que estariam 1,6 milhões de processos pendentes nos tribunais, números passíveis de ajustes.
Mais que decorridos 10 anos as pendências nos Tribunais baixaram? Há áreas onde estamos realmente melhor, como na acção executiva, muito por força das alterações introduzidas no Código Civil, em vigor desde 1 de Setembro de 2013.
Segundo dados estatísticos na Direcção-Geral da Política de Justiça em 2011/2012 encontravam-se pendentes 1.231.782 acções executivas e no final de 2020, esta pendência era de 457.284.
O mesmo não acontece nos Tribunais Administrativos e Fiscais de 1ª instância, onde as pendências não baixaram tanto como se esperava uma vez que no seu conjunto têm em 2020 o total 134.603 acções pendentes contra 151.568 em 2015.
A médio prazo saberemos também os efeitos da pandemia no aumento ou não das pendências judiciais em todos os Tribunais.
Sobre a execução das medidas adoptadas, o balanço de 10 anos de “Troika” e outros dados relevantes, convidamos a escrever nesta edição do Boletim OA a anterior Directora-Geral e o actual Director Geral da Direcção Geral da Política da Justiça.
Referências bibliográficas
Estatísticas da Justiça
https://estatisticas.justica.gov.pt/sites/siej/pt-pt/
“Os tribunais e a crise económica e financeira”
Estudo da FFMS – https://www.ffms.pt/FileDownload/9b92bcc4-545f-4fe5-b9c0-615d9c192ac1/os-tribunais-e-a-crise-economica