Sara Costa Ferreira tem 48 anos, e reside em Grijó, Vila Nova de Gaia.
Começou a exercer advocacia em Novembro de 2000, na comarca de Espinho. Por diversas circunstâncias que correram menos bem, teve de abandonar o escritório em Espinho e mudar o domicílio para a sua residência. Atualmente, é aí que tenta exercer advocacia, embora com muita dificuldade.
Isto porque, infelizmente, em julho de 2022 foi-lhe diagnosticada uma doença oncológica, com metastização óssea grave e generalizada. Desde o diagnóstico, a sua vida mudou completamente, com óbvias consequências na parte profissional.
Hoje, Sara vive diariamente com dores intensas, ao ponto de se tornarem incontroláveis, mesmo com medicação. Por esse motivo, depende da ajuda de terceiros para realizar as tarefas domésticas mais simples. Tem ajuda do marido, dos pais, e de uma empregada doméstica que, não tem vergonha de admitir, tem de ser paga pelos pais porque Sara não tem capacidade financeira para o fazer.
Neste momento não consegue tirar rentabilidade da profissão, por várias razões. Está muito condicionada fisicamente, tem muitas dores, não consegue passar muito tempo sentada ao computador, cansa-se facilmente, e por isso o que faz a nível de advocacia é muito pouco.
Com o parco rendimento que aufere, a Advogada admite que não tem qualquer possibilidade de pagar a contribuição mínima exigida pela Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS), atualmente fixada em 277,77€.
Sara considera que o sistema da CPAS é um sistema apenas contributivo, que não confere aos beneficiários qualquer apoio em situações como a sua. Sem qualquer apoio da CPAS, e se não tivesse ajuda do marido e dos pais, a Advogada confessa que, perante a sua situação, muito possivelmente seria uma indigente.
Com efeito, ainda que pagasse aquela contribuição, ao abrigo do Regulamento da CPAS, Sara não teria direito a baixa e, consequentemente, não receberia qualquer apoio. É por isso que muitos Advogados e Advogadas, em situações semelhantes à de Sara, optam por não pagar a contribuição, para a qual teriam de realizar um esforço financeiro acima das suas possibilidades e sem direito a qualquer contrapartida que os pudesse auxiliar nessa situação de vulnerabilidade.
“Entende que o sistema da Segurança Social é muito mais benéfico. Neste momento, se estivesse inscrita na Segurança Social, poderia estar a beneficiar de baixa médica e a receber algum apoio monetário, que a CPAS não dá.”
Sara participou no referendo realizado pela Ordem dos Advogados em junho de 2021, e foi a favor da livre escolha do sistema de previdência pelos/as Advogados/as. Entende que o sistema da Segurança Social é muito mais benéfico. Neste momento, se estivesse inscrita na Segurança Social, poderia estar a beneficiar de baixa médica e a receber algum apoio monetário, que a CPAS não dá. As despesas de saúde são muitas e esse apoio seria essencial. Apesar de estar a ser tratada no público, acaba por ter de complementar com terapias privadas não comparticipadas, para ajuda de combate à dor, as quais apenas pode pagar com ajuda dos pais.
“A Advogada diz que o futuro lhe causa muita angústia, porque não sabe sequer se algum dia terá uma reforma. Na verdade, quer contribuir seja para que sistema for, mas não pode contribuir com valores que não aufere.”
A Advogada diz que o futuro lhe causa muita angústia, porque não sabe sequer se algum dia terá uma reforma. Na verdade, quer contribuir seja para que sistema for, mas não pode contribuir com valores que não aufere. Considera que muitas pessoas não pagam as contribuições da CPAS porque não podem, porque os escalões não têm em consideração o rendimento dos/as Advogados/as – situação que, na sua opinião, deve ser alterada urgentemente, porque existem muitos Colegas em situações semelhantes à sua. Para Sara o justo seria cada um contribuir à medida das suas possibilidades, de acordo com o respetivo rendimento.
Sara refere que os/as Advogados/as são uma classe discriminada, prisioneira de um sistema que não acautela os seus direitos sociais. Nas suas palavras, “isto é desumano, é cruel, e muito mais para quem está doente e se vê impossibilitado de exercer a sua profissão”.
