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O Preço a Pagar

por Pedro Barosa

 

Há cerca de um ano foi realizado um inquérito à Advocacia Portuguesa com o propósito de recolher informação sobre a saúde e bem-estar na vida dos Advogados. As conclusões, já se adivinha, foram preocupantes, resultando patente uma acentuada falta de equilíbrio entre o tempo de trabalho e o tempo da vida pessoal. Em concreto, quase metade dos inquiridos sentem que o seu trabalho não lhes permite estar tanto tempo com a família quanto gostariam.

No mundo acelerado em que vivemos, parar significa ficar a perder. Se desligamos o telefone para fazer uma pausa – seja para refletir, seja apenas para almoçar –, acumulam-se as mensagens que temos de ler e os emails que ainda teremos de responder. Se nos ausentamos do escritório por um dia (mesmo que para comparecer numa diligência judicial), acumula-se o trabalho para tratar mais tarde.

Pedro Barosa

Autor: Pedro Barosa

Para a Advocacia em particular, há muito que esta cultura está instalada e teima em persistir. Ninguém tem culpa. Na verdade, o que os Advogados fazem, mais não é que desempenhar a singela tarefa de acompanhar o ritmo da atividade dinâmica dos clientes, dos vários processos ou assuntos que têm em mãos e de corresponder às constantes solicitações que lhes são dirigidas. Muitos fazem-no somente para sobreviver e pagar as contas, outros também para cumprir com os objetivos ambiciosos pretendidos pelas organizações com as quais colaboram. Alguns por mera necessidade. Outros com paixão.

Mas tudo tem um preço!

Queremos “estar em todas” e chegar a todo o lado. Não pretendemos falhar com os Clientes nem com os Colegas. Mas acabamos por perder o norte e falhar connosco mesmos, com as nossas famílias e com a nossa saúde. Para muitos, o exercício físico não é importante, o ato de dormir é algo secundário e nem há tempo sequer para ler uma história aos filhos. Em consequência, a ansiedade vive instalada, o stresse é excessivo, os casos de depressão aumentam e repetem-se os “burnouts”.

Embora represente uma preocupação crescente nos últimos anos, impõe-se apontar a nobre responsabilidade de colocar em cima da mesa o problema da saúde mental na Advocacia a um reputado Advogado e estimado Colega que fez despertar na nossa Classe a urgência na sua avaliação, prevenção e tratamento.

Penso dever-se à enorme coragem do Dr. João Vieira de Almeida e ao seu humilde testemunho no “Labirinto – Conversas sobre saúde mental” do Observador, o levantar do véu sobre uma realidade vivenciada por muitos, que, não obstante as aparências, se revela sombria.

Numa cultura cheia de tradições e, nalguns aspetos, tão amarrada ao passado, o estigma da psicoterapia num meio como o da Advocacia parece felizmente ter-se reduzido. O tabu social dissipou-se e o ato de procurar ajuda já não é um sinal de fraqueza.

Estamos, portanto, no bom caminho.

Afinal de contas, para ajudarmos os outros, temos primeiro de cuidar de nós.