No final do século XX o mundo tomou consciência da sua fragilidade e da desigualdade crescente entre os vários países, especialmente em função dos recursos disponíveis e da sua distribuição, da escassez de bens e do consumo excessivo, e consequente desequilíbrio que as alterações climáticas já anunciavam. (v. Resolução da AGNU 12/1988). Em 1992 realizou-se a ECO-92, Conferência das Nações Unidas para o Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, com o objectivo de reconciliar o desenvolvimento económico com a protecção do ambiente.
Todavia, em 2000 ainda mal se falava de sustentabilidade. O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea (da Academia das Ciências de Lisboa e Editorial Verbo, 2001) tinha apenas uma única entrada para sustentável – “que é susceptível de se manter, defender; que se pode sustentar”. Actualmente, consultada a Infopedia (*) encontramos como um dos significados de sustentável “realizado de forma a não esgotar os recursos naturais nem causar danos ambientais”, encontrando também sustentabilidade. Genericamente, pode “traduzir-se” sustentabilidade como a capacidade de satisfazer as nossas necessidades no presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades.
Duas décadas passadas a preocupação mundial com a sustentabilidade é generalizada, a nível nacional e global. Em 2002 a Campanha do Milénio das Nações Unidas iniciou os trabalhos para definição das medidas de apoio aos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, que deram origem aos 8 Objectivos a concretizar até 2015. Nesse ano na Cimeira das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável foi aprovada por 193 membros a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas, constituída por 17 Objectivos para o Desenvolvimento Sustentável, resultado do trabalho conjunto de governos e cidadãos de todo o mundo para criar um novo modelo global para acabar com a pobreza, promover a prosperidade e o bem-estar de todos, proteger o ambiente e combater as alterações climáticas.
A SUSTENTABILIDADE NESTA EDIÇÃO
Falamos de Justiça Climática a propósito de alguns casos emblemáticos de litígios climáticos e decisões judiciais que trazem nova esperança a este combate e reforçam o Direito à protecção do clima como um verdadeiro Direito Humano fundamental.
Segundo Paulo Magalhães, um dos fundadores do projecto Casa Comum da Humanidade, “… a existência factual de um bem comum intangível e global – o padrão de funcionamento do sistema terrestre que corresponde a um clima estável, não é reconhecido como existente no plano jurídico. Para contornar a omissão de um bem comum que não encaixa com os pilares do direito internacional, criou-se um sistema de compromissos com o objectivo de reduzir emissões, sem alterar o modelo económico que está na origem dessas emissões. No fundo os desafios incontornáveis que o clima impõe ao direito e à economia, foram evitados através de um conceito indefinido como é o da “Preocupação Comum da Humanidade”
Convidámos Filipa Saldanha, Subdirectora do Programa Gulbenkian Desenvolvimento Sustentável a escrever sobre este programa.
Daniel Gomes é um dos impulsionadores da implementação de um sistema de depósito de embalagens em Portugal, o projecto Tara Recuperável, e escreve-nos sobre a importância de legislar sobre esta matéria como motor para atingir a sustentabilidade.
Sobre a nova política para a provisão e remuneração de serviços dos ecossistemas em espaços rurais em Portugal escrevem Rui Ferreira dos Santos, Paula Antunes, Carlos Rio Carvalho e Alexandra Aragão, que reforçam a necessidade de adoção de políticas públicas de natureza ambiental que alinhem os interesses da sociedade e das gerações futuras com os dos proprietários e gestores da terra.
A sustentabilidade, nas suas múltiplas dimensões – social, económica e ambiental, tem muitas outras abordagens tais como a importância de definição de Politicas Públicas de Sustentabilidade, enquanto contributo determinante para a Justiça Intergeracional no futuro; a análise das actuais políticas sociais em confronto com desenvolvimento económico seguido e se este é efectivamente sustentável; o papel das empresas na transição para um mundo mais sustentável, difundido pela BCSD Portugal que integra a Rede Global do World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), Temas a acompanhar no futuro, sem dúvida.
De salientar que Portugal aprovou no passado dia 5 de Novembro a Lei de Bases do Clima, sendo o primeiro país a considerar o Clima como Património Comum da Humanidade e comprometendo-se a promover este reconhecimento junto da Organização das Nações Unidas.
Produção têxtil, economia circular e sustentabilidade
A indústria têxtil é uma das mais poluentes, da produção ao fabrico, do transporte ao uso e consumo, passando pela reutilização e reciclagem. Com impactos ambientais ao nível do consumo de água, da erosão dos solos, da emissão de CO2 e dos resíduos e desperdícios resultantes, há ainda a considerar os impactos sociais associados ao baixo custo de mão-de-obra, às condições precárias de trabalho; à desigualdade e disparidade salarial, à localização de fábricas têxteis em zonas do global com legislação laboral pouco exigente.
Segundo dados da Agência Europeia do Ambiente para produzir uma t-shirt são necessários 2700 litros de água, a água potável suficiente para uma pessoa consumir durante 2,5 anos; 35% dos microplásticos primários libertados para o ambiente têm origem na produção de têxteis; sendo a produção têxtil responsável por cerca de 20% da poluição da água potável à escala mundial decorrente da utilização de produtos para tingimento e acabamento; 10% das emissões mundiais de gases com efeito de estufa provêm da produção de vestuário e calçado, mais do que os voos internacionais e o transporte marítimo em conjunto. Em Portugal, a Agência Portuguesa do Ambiente indica que os portugueses deitam 200 mil toneladas de roupa para o lixo todos os anos. Em 2030 estima-se que o nível total de resíduos de vestuário possa chegar aos 148 milhões de toneladas – equivalente ao desperdício anual de 17,5kg per capita em todo o planeta.

Em 2019, a Comissão Europeia identificou os têxteis (vestuário e tecidos) como uma ‘categoria de produtos prioritários para a economia circular’, considerando a Agência Europeia do Ambiente que modelos de negócios circulares apoiados por regulamentos e outras políticas devem não apenas visar à circularidade em pequena escala, mas também estimular mudanças sistémicas em todo o sistema têxtil em direcção a uma economia circular, alimentada por materiais e produtos sustentáveis e seguros.
(*) Sustentável https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/sustent%C3%A1vel
(**) The 17 Goals – Sustainable Development Goals – the United Nations to 2030