O mercado de capitais: ontem, hoje e amanhã
A Bolsa é uma construção centenária: a Bolsa Portuguesa – uma das mais antigas do Mundo – teve os seus primórdios em 1769 na Praça do Comércio, pela mão do então secretário de Estado Sebastião José Carvalho e Melo, futuro Marquês de Pombal.
E desde sempre, as bolsas foram o que ainda são hoje: mercados onde quem quer comprar se encontra com quer vender. No início eram mercadorias ou bens físicos. Mais tarde passaram a ser títulos de crédito – o caso das atuais obrigações – ou de propriedade – o caso das atuais ações, que passaram a ser transacionados entre os atuais detentores e potenciais investidores. Ainda mais tarde, surgiram instrumentos transacionados em Bolsa cujo subjacente eram ativos físicos como as mercadorias como financeiros onde se incluiam ações ou obrigações. Os derivados foram uma das grandes inovações dos mercados financeiros, permitindo que empresas e investidores beneficiem da enorme flexibilidade do mercado de capitais para as suas estratégias – seja para limitar o risco de subida de preços, arbitrar diferenças geográficas ou pura e simplesmente aplicar poupanças com base em expectativas futuras.
A bolsa foi um dos locais, físicos e virtuais, onde a tecnologia foi determinante no seu sucesso: longe vão os tempos onde os corretores davam ordens aos gritos frente a frente numa pequena sala.
As telecomunicações (telegramas, telefones, telexes, correio eletrónico…) permitiram que a distância se encurtasse, e que hoje em dia um investidor numa ilha no Pacífico possa comprar ou vender ações portuguesas com apenas meia dúzia de cliques no seu portátil. E a tecnologia reduziu o tempo de espera e de execução de uma ordem de compra de algumas horas para uma fração de segundo, contribuindo para uma maior vivacidade, dinamismo e frequência de negociação. A liquidez é hoje em dia um dos principais atributos dos mercados de Bolsa.
Não é o único motivo que suscita o interesse das empresas que ponderem a admissão em Bolsa: o financiamento, ou capacidade de angariar capitais próprios ou alheios, continua a ser a razão preponderante. É natural que assim seja: as Bolsas são hoje em dia mercados verdadeiramente globais, o que implica que uma empresa cotada tenha acesso potencial a uma capacidade de financiamento quase “infinita”. O desafio para as empresas cotadas passa por terem uma proposta – de crescimento, valor ou outros critérios – convincente e diferenciadora. Em boa medida, é também um desafio de comunicação: saber contar uma história que explique, de forma clara, transparente e relevante, o que é a empresa hoje e como pode evoluir no futuro. Porque a Bolsa também traz simultaneamente um desafio e oportunidade enormes: estar sempre presente e visível, aos olhos de uma vasta comunidade global. Esta oportunidade, se bem utilizada, pode transformar uma empresa paroquial num verdadeiro líder global.
Muito se diz sobre o grau de complexidade dos mercados de capitais e sobre como as suas exigências dificultam o acesso a empresas de menores dimensões. Ora, se por um lado é certo que o número de empresas cotadas se tem reduzido com o passar dos anos – e é um fenómeno transversal nos mercados desenvolvidos do mundo ocidental, não apenas em Portugal – também as que se mantêm cotadas têm sabido reinventar-se e crescer tirando partido do mercado. Além disso, as transformações na economia tornaram alguns setores obsoletos, levando ao seu progressivo desaparecimento da Bolsa; mas também trouxeram novas empresas em setores dinâmicos, nomeadamente no setor energético e tecnológico.
Adicionalmente, as Bolsas têm respondido a esta assimetria entre empresas grandes e instaladas por um lado, e nascentes ou pequenas por outro, operando mercados com requisitos diferenciados de admissão: os mercados juniores têm tido uma crescente aceitação por empresas que aspiram a uma abordagem gradual e adaptada aos seus objetivos e grau de maturidade.
Outra transformação mais recente, mas com especial impacto nos mercados financeiros, tem a ver com a sustentabilidade, a transição energética ou as discussões sob o acrónimo ESG (Environmental, Social and Governance): a crescente consciencialização da sociedade para estes enomes e cruciais desafios levou a que as preferências de investimento ponderem fatores para além do simples binómio rendimento-risco, e incluam por exemplo projetos de transição para uma sociedade mais justa ou um planeta mais sustentável.
Por sua vez, a influência dos investidores são um poderoso incentivo para as empresas alterarem a sua atuação, sob pena de perderem competitividade no mercado global. As finanças sustentáveis têm tido uma verdadeira explosão nos mercados de capitais, e provavelmente continuarão ser um grande motor futuro.
A Bolsa Portuguesa, gerida pela Euronext, tem sido um ator presente na globalização e inovação dos mercados financeiros. Na globalização, realce para a inclusão desde há 20 anos no Grupo Euronext: a maior bolsa Europeia, com presença em sete praças e onde cerca de 2.000 empresas cotadas (incluindo mais de 1.500 PMEs e mais de 700 empresas tecnológicas) são negociadas diariamente por mais de 6.000 investidores institucionais e um sem número de investidores particulares. Neste sentido já não existe propriamente uma “Bolsa Portuguesa”, mas um conjunto de empresas portuguesas que estão integradas num grande mercado de capitais europeu e global.
Na inovação, a Euronext tem proporcionado às empresas e investidores portugueses uma plataforma state-of-the art com todas as funcionalidades caracteristicas dos mercados mais sofisticados: nas platafomas de negociação onde a plataforma proprietária da Euronext (OPTIQ) é a expressão mais recente; na inclusão de contratos derivados sobre mercadorias, contratos energéticos ou índices; no crescente peso dos mercados de dívida com mais de 50.000 emissões cotadas e negociadas em bolsa; ou no peso crescente dos instrumentos de finanças sustentáveis, de que as green bonds são o mais visível exemplo.
E as empresas portuguesas têm tirado partido deste mercado simultanemente global e inovador: foram mais de 10 mil milhões de euros de financiamento, entre emissões de obrigações e aumentos de capital nos últimos cinco anos, que as empresas portuguesas obtiveram no mercado de capitais internacional. Vários são os testemunhos de empresas cotadas afirmando que se não fossem cotadas, teriam maior dificuldade em singrar nos mercados mundais. E ao invés, a sua exposição internacional tem facilitado colocações de capital ou dívida em montantes significativos e com diversidade de captação de investidores internacionais.
A oportunidade de mobilizar capital internacional para diversificar as fontes de financiamento da economia portuguesa, e fortalecer o capital das empresas e do setor financeiro, deve continuar a ser uma possibilidade e uma oportunidade que mais empresas devem ter nas suas opções estratégicas de financiamento, se quisermos acelerar o crescimento e o desenvolvimento de Portugal