Inseminação post mortem e Gestação de substituição
A Ordem dos Advogados é, nos termos do artigo 3ª alínea j) do EOA, “ouvida sobre os projetos de diplomas legislativos que interessem ao exercício da advocacia e ao patrocínio judiciário em geral” propondo no âmbito do processo legislativo as alterações legislativas que entende convenientes. Destacamos alguns dos muitos pareceres emitidos pela Ordem em 2021.
O Grupo de Trabalho da Procriação Medicamente Assistida solicitou à Ordem dos Advogados (OA) Parecer relativamente às várias iniciativas legislativas apresentadas que versam ou afectam bens ou direitos de personalidade e com implicações no domínio familiar e sucessório.
No âmbito da Inseminação post mortem foram apresentados o Projecto de Lei n.º 214/XIV/1.ª (Cidadãos); o Projecto de Lei n.º 223/XIV/1.ª (PS); o Projecto de Lei n.º 237/XIV/1.ª (BE); o Projecto de Lei n.º 572/XIV/1.ª (PCP).
A OA considera que estes diplomas parecem visar a respectiva aplicação a situações passadas, isto é, a consentimento passado, e que uma tal aplicação pode suscitar problemas do ponto de vista da tutela das expectativas dos cidadãos e da necessária segurança jurídica e confiança legítima e que a ser aprovada a ser aprovada, a lei parece dever valer apenas para o futuro, para situações a iniciar no futuro, para consentimentos a emitir no futuro, após a respectiva entrada em vigor. Trata-se de uma lei que versa sobre o exercício de direitos, liberdades e garantias de cidadãos (artigo 18.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa) e que prevê condições de validade de uma situação não abstraindo do facto que o origina (o consentimento), pelo que a sua aplicação a actos (consentimentos passados) pode afigurar-se criadora de ficções jurídicas e de atentados à liberdade de autodeterminação de quem consentiu, sem referir expressamente a sua intenção quanto a inseminações post-mortem, não parecendo que exista um interesse público que deva ditar solução distinta.
Igualmente importante parece ser o âmbito do consentimento, o qual nos parece dever incluir referência expressa a “consentimento relativo a acto de inseminação post-mortem” e não apenas a acto de inseminação. Mais latamente, as referências a consentimento devem incluir a referência a actos a praticar após a morte do titular. Um consentimento fora destes parâmetros poderá vir a ser considerado nulo, porque contrário à ordem pública, situação que convirá acautelar.
E finalmente considera que os diplomas não parecem ponderar as questões sucessórias que se podem suscitar, à luz do Código Civil. Seria importante reflectir sobre o efeito da circunstância de a criança ser havida como filha do falecido. Com efeito, sendo a abertura da sucessão anterior ao nascimento, essa filiação será, logo neste aspecto, diferente. Acresce que os efeitos sucessórios não se produzem apenas quanto à relação entre o dador conhecido-pai e o filho, mas dentro do círculo sucessório recortado por lei, pelo que, também aqui parece ser importante esclarecer estes aspetos.
No âmbito da Gestação de substituição foram apresentados o Projecto de Lei n.º 71/XIV/1, que pretende alterar o regime jurídico da gestação de substituição (Sétima alteração à Lei n.º 32/2006, de 26 de Julho) e o Projecto de Lei 247/XIV-1ª, que garante o acesso à gestação de substituição.
Esta iniciativa legislativa versa sobre matéria relativamente à qual do Tribunal Constitucional já se pronunciou através do Acórdão 225/2018, publicado no Diário da República n.º 87/2018, Série, de 7 de Maio de 2018.
A Ordem dos Advogados considera que as coordenadas gerais e a intencionalidade subjacente a essa jurisprudência constitucional delimitam o juízo e o quadrante de qualquer iniciativa legislativa sobre o mesmo tema. O texto integral do parecer da Ordem pode ser consultado aqui >>>